Você viu meu servo? (2)
“Perguntou o Senhor a Satanás: Observaste o meu servo Jó? Porque ninguém há na terra semelhante a ele, homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desvia do mal. Ele conserva a sua integridade, embora me incitasses contra ele, para o consumir sem causa.” Jó 2:3
A aparente tranquilidade da vida de Jó sofrerá uma tremenda mudança, a partir das insinuações de Satanás e da permissão de Deus. Diante da pergunta feita por Deus, chamando a atenção de todos os Seus ouvintes, naquela ocasião, para a vida devota e íntegra de Jó, Satanás devolve a questão com uma dura acusação: Será que Jó não tem razões para temer a Deus?” (Jó 1:9) Será que Jó não está apenas respondendo positivamente às bênçãos que tem recebido de Tuas mãos? Será que ele O teme por nada? Será que sua devoção é de fato sem reservas, ou ela tem um preço? Será que não tens pago pelo benefício da fidelidade de Jó?
Satanás passa a insinuar que Jó tinha motivos bem específicos para servir a Deus. Tenta convencer sua audiência de que os motivos de Jó são egoístas e mal intencionados. Seu argumento segue na tentativa de propor um arranjo de favores combinados entre Deus e o patriarca em questão, afinal, Deus o recompensava satisfatoriamente por sua fidelidade e serviço. Tenta negar a motivação da verdadeira religião, que emana do amor e de uma apreciação racional do caráter de Deus. Sua sugestão (ainda hoje) aponta para a necessidade de barganhas no trato entre Deus e Seus filhos, para atender uma espécie de necessidade de Deus em ser adorado. Sua intenção de atacar o caráter do Altíssimo, e de acusá-Lo de injusto, fica cada vez mais evidente. No entanto, ele mesmo, Satanás, vai descobrir que os verdadeiros adoradores do Eterno amam a Deus por quem Ele é, e não por conta do que recebem dEle; vai descobrir que os servos de Deus se colocaram à Sua disposição como manifestação de gratidão e reconhecimento de Sua soberania e autoridade, não por medo de qualquer tipo de castigo destinado aos desobedientes.
Jó perde tudo. Os bens são saqueados, os filhos morrem num incidente estranho, e ele, de repente, se vê sem nada daquilo que levara uma vida para construir. Fica apenas ele e a esposa, para prantearem juntos, as perdas que sofreram – principalmente os filhos. Mas tão surpreendente quanto a sucessão de notícias ruins é a resposta de Jó a tudo o que está acontecendo. “Ao ouvir isso, Jó levantou-se, rasgou o manto e rapou a cabeça. Então prostrou-se no chão em adoração, e disse: Saí nu do ventre da minha mãe, e nu partirei. O Senhor o deu, o Senhor o levou; louvado seja o nome do Senhor” (Jó 1:20-21).
As intenções de Satanás continuam dando errado. O comportamento de Jó depõe contra seu argumento e frustra suas intenções de convencer a audiência do caráter injusto de Deus. Imaginou que Jó logo amaldiçoaria a Deus e O culparia pelos males ocorridos. Sua expectativa, no entanto, foi anulada pelo ato de adoração de Jó, e por essa Satanás não esperava, e novamente o Senhor chama a sua atenção para a vida integrada e reta de Jó, não porque desejasse provocar sentimentos ainda piores no coração do anjo caído, mas para deixar claro que seu plano falhara, outra vez. A primeira vez que esses argumentos foram apresentados ele conseguiu convencer um terço dos anjos do Céu, mas já naquele tempo, a maioria se posicionou ao lado de Deus.
Mas o Inimigo acredita que ainda tenha uma “carta da manga”, afinal, mesmo que Jó tenha perdido tudo, ainda lhe restara a saúde; se pudesse tocar nessa área da vida do patriarca ele certamente revelaria sua verdadeira natureza ambiciosa. “Pele por pele!”, respondeu Satanás. “Um homem dará tudo o que tem por sua vida. Estende a tua mão e fere a sua carne e os seus ossos, e com certeza ele te amaldiçoará na tua face” (Jó 2:4-5). Sua estratégia agora é convencer seus ouvintes de que nenhuma prova severa o suficiente havia sido imposta ao patriarca. Ele acredita que o verdadeiro caráter de Jó será revelado quando ele estiver sob risco de perder a vida, afinal, acredita Satanás, todo homem tem o seu preço. Ele mesmo é testemunha do que diz. Seu modus operandi tem sido este desde sempre. Comprara a atenção e a desobediência de Eva com a oferta de um conhecimento que ainda não tinham e com a proposta de serem iguais a Deus. “Compra”, até hoje, sem o menor constrangimento, a adoração da humanidade com favores que promete vir até da parte de Deus. Promete favores do Céu para desviar o coração dos homens do plano estabelecido por Deus, pervertendo a imagem que deveríamos ter do Salvador.
Foi ele, Satanás, quem nos fez acreditar que Deus está disposto a fazer qualquer coisa para receber nossa atenção. Foi ele quem nos convenceu de haver, em algum lugar do Universo, um Deus orgulhoso, vingativo, castigador; um Deus que não admite desaforos e por isso responde, imediatamente, com terríveis calamidades, para provar que não pode ser contrariado, quando o assunto é adoração. Seu plano de vida (do Inimigo) tem sido nos convencer de que o Eterno possui as características que ele sabe que são suas. Ele é quem trabalha com barganhas, acordos e manipulações; ele é quem usa do expediente da troca de favores e tenta comprar, a todo custo, o amor dos Filhos de Deus. Ele não aceita, de forma alguma, a realidade evidenciada na vida de Jó – os verdadeiros filhos de Deus O adoram pelo que Ele é, pelo benefício de Sua companhia e como manifestação de amor genuíno!
O Inimigo, por vezes, tem se orgulhado de estar sendo bem sucedido em seu plano de provocar a destruição da humanidade. A tempos que investe seus recursos diabólicos na tarefa de eliminar, no ser humano, as características que nos remetem à lembrança de que fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Quando observamos o comportamento de uma pequena parcela da sociedade, percebemos o estrago promovido por alguém que quer, a todo custo, afetar o coração de Deus, atacando Seus amados filhos. Por vezes, tenho a sensação de que se tornou o objetivo de vida de Satanás usar-nos como instrumentos de guerra contra um Deus que é a essência do amor, e pior, muitas vezes tem cedido espaço em meu coração às propagandas enganosas que ele faz o tempo todo. Já quase me vi convencido de que posso fazer alguma coisa para merecer o favor de Deus. Já me peguei imaginando as razões pelas quais Deus deixou de me abençoar. Já me vi negociando com Deus, como se Ele tivesse alguma dívida comigo, por conta de minha dedicação religiosa. Já abri mão de decidir adorá-Lo pelo reconhecimento de quem sou e de quem Ele é, para viver uma religião baseada no medo de ser terrivelmente castigado e condenado a uma vida de lutas e sofrimentos sem fim.
Mas esse não é, e nunca foi o plano de Deus para minha vida. Deus não usa o expediente do medo para receber amor; não faz barganhas para receber minha atenção. Deus não usa a manipulação e acordos estranhos para me manter fiel a Ele. A expectativa do Céu é que eu me mantenha fiel por pleno reconhecimento de quem realmente sou. No coração do Eterno há o desejo de que minha religiosidade se desenvolva pelos princípios da integridade e retidão e no pleno exercício de uma vida que se desvia do mal. Contrariando o plano do Inimigo, luto para ter condições de oferecer a mesma resposta de Jó; esforço-me para reconhecer minhas limitações e aceitar o auxílio que vem do Céu, na intenção de tornar-me uma testemunha fiel do amor de Deus.
Luto contra minha natureza na expectativa de conseguir enxergar além das circunstâncias adversas do dia a dia, confiando que o Senhor cuidará pessoalmente dos detalhes que não consigo enxergar, afinal, sem nada eu saí do ventre da minha mãe, e nada levarei comigo quando partir. O Senhor me deu, e se for o caso, o Senhor poderá levar de volta; louvado seja o nome do Senhor, a quem tudo, e todos, pertencem.
Marcilio Egidio
Esposo, pai e pastor – nessa ordem. Eterno aprendiz da arte de servir. Alguém que decidiu colecionar os melhores amigos que a vida pode oferecer.