Ossos podem voltar a viver?

“Então, me perguntou: Filho do homem, acaso, poderão reviver estes ossos? Respondi: Senhor Deus, tu o sabes.”    Ezequiel 37:3

Nossa pergunta de hoje, a exemplo do que ocorreu na história anterior, parte da visão de um homem, no exercício de seu ministério profético. No contexto deste verso, Ezequiel declara que a mão do Senhor veio sobre ele, e o Espírito do Senhor o levou a um vale cheio de ossos. Deus, então, nessa visão, conduziu por entre os ossos que cobriam o fundo do vale. Os ossos eram tantos que cobriam completamente o vale, e por certo estavam ali havia muito tempo, porque estavam completamente secos.

“Filho do homem, acaso estes ossos podem voltar a viver?” – pergunta o Senhor ao profeta. Existe alguma chance de se restaurar a vida nesses ossos, dada a situação em que estão? Teria alguém habilidade para juntar cada osso ao seu correspondente de maneira a erguer outra vez as pessoas a quem eles pertenceram um dia? Será que não correria o risco de trocar algumas peças nesse “quebra-cabeça” gigante?

Mesmo que todas essas questões estivessem relacionadas à pergunta original, não era nada disso que o Senhor queria saber. Não estava interessado em receber uma resposta automática do profeta, mas provocar, como já dissemos nas outras vezes, uma importante reflexão, afinal, as condições do povo de Israel eram mais ou menos aquelas retratadas na visão do profeta. Muitos haviam perdido as esperanças, outros tantos escolheram abandonar o Senhor, e a nação israelita estava espalhada por toda parte do exílio. Ainda assim, Deus encontra uma forma de mostrar que as coisas não precisavam permanecer como estavam. Ainda que parecesse improvável e impossível tornar vivos os corpos que ali não passavam de ossos secos, o Senhor Deus poderia fazê-lo.

Conta-se que certa vez vários grupos de pessoas paravam em frente a uma loja de objetos de arte, numa das mais concorridas ruas de Londres, atraídos por uma bela gravura, cópia de um quadro célebre representando a cena da Crucifixão. Muitas delas, em meio ao movimento de uma vida de agitações, se detinham por instantes para contemplar o quadro que de novo lhes contava a “A velha história de Jesus e Seu Amor”.  Alguns, como já era de se esperar, pareciam indiferentes ao significado do quadro. Sua atenção voltava-se apenas para o talento do artista, que de fato era admirável. Dado, justamente, à habilidade do artista, também não eram poucos os que mostravam pela expressão, quando se retiravam, que tinham tido uma nova visão do amor de Deus.

Entre os que chegaram para apreciar com um pouco mais de cuidado a gravura, estava um rapazinho, pobre e faminto, de pés descalços e rosto sujo pela poeira das ruas. Esforçou-se o quanto pôde para chegar mais perto da vitrine do estabelecimento, tanto que quase tocou com o rosto o vidro da loja, na ânsia de ver bem de perto todos os pormenores da gravura. Olhava para a figura como quem não resiste a um encanto. Dava a impressão de negar-se até mesmo a piscar para não perder a beleza que o momento lhe proporcionava.

“Você sabe o que é isto, meu rapaz”?, perguntou um homem que se achava ao seu lado, impressionado com a ardente e ansiosa expressão da criança.  “Claro que sim, senhor!”, respondeu o pequeno, parecendo admirado da pergunta. “É Jesus”.

“E o que é que eles estão fazendo?”

“O quê? O senhor não sabe? Ele está perto do momento de Sua morte. Olhe! Lá estão os soldados que o pregaram na cruz. Aquela ali é Maria, sua mãe, chorando, e junto a ela outras pessoas que O amavam. Aqueles dois são os ladrões que morreram no mesmo dia que o Salvador. Só um deles se arrependeu”.

Com o dedo magro e um pouco sujo, ia apontando cada figura do quadro, descrevendo, com um brilho nos olhos, os detalhes de cada personagem que estava em sua memória e, como o cavalheiro ficasse silencioso, o rapazinho continuou: “Ele morreu, senhor, Ele morreu, porque nós somos maus e não podíamos ir para o Céu de outra maneira, sabe?”.

“Onde você aprendeu isso tudo, meu rapaz?”

“Na Escola Dominical, senhor. O professor contou-nos, mas eu nunca tinha visto a gravura”.

O homem procurou algo tão gentil quanto o que acabara de ouvir do garoto para dizer-lhe enquanto se despedia e continuava o seu caminho, mas ainda não ia muito longe quando ouviu atrás de si uns pés descalços e sentiu uma mãozinha tocar-lhe no braço. Olhando, viu que era o mesmo amiguinho com quem conversara em frente à loja, havia pouco tempo, e ficou admirado da luz que parecia transformar a sua face pálida.

“Moço!”, exclamou o rapaz com a alegria de quem se recuperara a tempo de dar a melhor notícia de todos os tempos e por pouco não fora esquecida, “eu queria dizer-lhe que Ele ressuscitou. Ressuscitou! Eles mataram Jesus, mas ele ressuscitou”! E, com isto, o pequeno foi embora e logo desapareceu entre a multidão.  Aquele garotinho, talvez um morador de rua, pobre em bens deste mundo, mas rico no conhecimento e na confiança do amor do Salvador.

Cada dia que passa nos encontramos diante da realidade de um mundo cada vez mais distante de Deus. Incrível é pensar que nunca se falou tanto dEle, e nunca estivemos tão distantes. Nos acostumamos com uma religião de aparência a tal ponto de acreditar que cumprir os compromissos religiosos já são suficientes para garantir os favores de Deus. Participamos de eventos que lembram o ministério e morte de Cristo como quem está diante de um quadro exposto na vitrine de uma loja de artes. Alguns param apenas para saber o preço, outros para avaliar a performance do artista. Há ainda aqueles que procuram por defeitos, e uns poucos que se permitem ser tocados com a experiência proposta para o momento. Esses poucos são capazes de perceber a beleza do quadro, não apenas pela habilidade do pintor, mas pela história que está sendo contada por eles – pelo quadro e pelo pintor!

Como garotos diante da imagem, nunca vista, de uma história, nunca esquecida, reconhecem, como o profeta, que há no Céu um Deus que ainda é capaz de realizar qualquer coisa para ver Seus filhos felizes. Um Deus capaz de transformar um vale de ossos secos num exército de homens e mulheres dispostos a anunciar a melhor notícia de todos os tempos: “Ele ressuscitou. Ressuscitou! Eles mataram Jesus, mas ele ressuscitou”!  

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Marcilio Egidio

Esposo, pai e pastor – nessa ordem. Eterno aprendiz da arte de servir. Alguém que decidiu colecionar os melhores amigos que a vida pode oferecer.