É razoável a tua ira?

Peço-te, pois, ó Senhor , tira-me a vida, porque melhor me é morrer do que viver.
E disse o Senhor : É razoável essa tua ira?

Jonas 4:3-4

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Imagino que os três dias que passou na barriga do peixe tenham sido os mais difíceis da vida de Jonas. Se não foram aqueles os mais difíceis, então somente uma experiência muito dura poderia fazê-lo refletir melhor do que o tempo que passou submerso, sem saber exatamente onde estava ou imaginar o que poderia lhe acontecer. Como vimos ontem, o profeta optou pela melhor saída. Decidiu pelo exercício da fé, erguendo ao Céu uma prece, fazendo uso da oração como recurso para salvação. Sua conversa sincera com Deus demonstra sua confiança naquele que poderia de fato solucionar o seu problema.

Como vimos, orou na certeza de que ainda teria uma chance de atender a ordem de Deus; conversou, de coração aberto, com Alguém que conhecia de perto. Sua oração evidencia que Jonas tinha consciência de suas limitações humanas, e não havia nada em si mesmo que pudesse ser comparado ao poder de Deus. Orou como quem sabia que Deus não estaria interessado em aumentar sua culpa, mas provocar o arrependimento; sabia que a pergunta, se fosse feita, teria a clara intenção de provocar uma mudança para melhor, no comportamento dele mesmo, um profeta fugitivo!

Três dias depois achou-se caído na praia, tendo à sua frente a cidade de Nínive. Sabia exatamente o que deveria ser feito, e desta vez não se negaria a pregar naquela cidade a mensagem que Deus lhe ordenara apresentar. “Dispõe-te, vai à grande cidade de Nínive e proclama contra ela a mensagem que eu te digo. Levantou-se, pois, Jonas e foi a Nínive, segundo a palavra do Senhor. Ora, Nínive era cidade mui importante diante de Deus e de três dias para percorrê-la” (Jn 3:2-3).

O texto bíblico diz que a pregação de Jonas foi o suficiente para promover o arrependimento no coração dos moradores da cidade de Nínive. Do maior ao menor, eles se convenceram de seus maus caminhos, proclamaram um jejum e vestiram de pano de saco.  O próprio rei de Nínive “levantou-se do seu trono, tirou de si as vestes reais, cobriu-se de pano de saco e assentou-se sobre cinza” (Jn 3:6). Reagindo, não apenas à manifestação do povo, mas principalmente por conta da mensagem pregada por Jonas, deu ordens explícitas ao seu povo: “Por mandado do rei e seus grandes, nem homens, nem animais, nem bois, nem ovelhas provem coisa alguma, nem os levem ao pasto, nem bebam água; mas sejam cobertos de pano de saco, tanto os homens como os animais, e clamarão fortemente a Deus; e se converterão, cada um do seu mau caminho e da violência que há nas suas mãos” (Jn 3:7-8).

Diante desse quadro de arrependimento, o Senhor Deus decidiu, então, voltar atrás em seu plano de destruir a cidade Nínive. Era de se esperar, portanto, que este “final feliz” deixasse o profeta animado para comemorar o sucesso de sua campanha evangelística, mas nada disso aconteceu, pelo contrário, “com isso, desgostou-se Jonas extremamente e ficou irado” (Jn 4:1). Como se não bastasse sua reação de indignação, decidiu apresentar a Deus seus sentimentos: Ah! Senhor! Não foi isso o que eu disse, estando ainda na minha terra? Por isso, me adiantei, fugindo para Társis, pois sabia que és Deus clemente, e misericordioso, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e que te arrependes do mal” (Jn 4:2).

Incrível! Quando lemos pela primeira vez temos a impressão de que não é nada disso que está acontecendo, mas é isso mesmo! O profeta resolveu demonstrar-se indignado porque Deus agiu com misericórdia e decidiu não destruir a cidade. Pior que isso, para demonstrar seu nível de revolta, encerra sua oração com um pedido especial: “Peço-te, pois, ó Senhor, tira-me a vida, porque melhor me é morrer do que viver” (Jn 4:3). É simplesmente inacreditável!, sou tentado a pensar (mas calma, essa é uma reação mais comum do que imaginamos!).

Deus então decide falar com o profeta: “É razoável essa tua ira?” (Jn 4:4). Você acha certo ficar tão irado assim? (NVT); você acha razoável essa tua raiva? (NAA); você tem alguma razão para essa tua fúria? (NVI); tens por acaso algum motivo para te irar? – é a mesma pergunta em outras versões da Bíblia. Talvez eu mesmo perguntasse: Posso saber por que você ficou tão estressado, Jonas?

De repente, o profeta parece se esquecer que ele mesmo acabara de ser alvo da graça e misericórdia de Deus. Esqueceu do tempo que passou nas entranhas do peixe e da oração que fizera. Voltou atrás em sua promessa, e agora, demonstra não concordar com a decisão de Deus. Então, como deveriam ficar as coisas sob a ótica da justiça de Jonas? O que deveria realmente acontecer aos moradores de Nínive, e por quê? Como deveria ser escritos o último capítulo do livro que leva o nome do profeta fujão e birrento?

Como disse, já estive “calçando os sapatos de Jonas”. Já me dispus a julgar a partir do meu senso de justiça. Já desejei um fim nada agradável a quem me fez mal. Já me peguei dizendo para Deus como eu queria que fossem tratados aqueles que eu havia julgado. Mas toda vez que me imaginei recebendo o juízo que eu mesmo formara, recebendo a sentença que eu havia declarado, estremeci de medo por lembrar que não havia sido nada justo, até porque é exatamente isso o que geralmente acontece: não queremos ser alvos dos atos de “justiça” que promovemos. Do nosso ponto de visto, quem sempre merece ser tratado com misericórdia somos nós – os outros devem sempre pagar pelo mal cometido!

Nosso amigo Jonas, profeta fujão, birrento e revoltado, chega quase a pedir que Deus faça uma escolha entre ele e os moradores de Nínive. “Se for para ser assim, Senhor, então eu estou fora! Para mim, nestes termos, é melhor morrer do que viver”. Parece até que estou ouvindo o Senhor falando comigo, exatamente agora: “Não acredito, Marcilio, que tens compaixão de coisas que podem ser compradas e negociadas, ou de plantas, por exemplo, como a que Jonas não fez nascer ou crescer, que numa noite nasceu e numa noite pereceu; e não hei de eu ter compaixão dos moradores da Terra, sejam eles quantos forem, que não sabem discernir, ainda, entre o certo e o errado, só porque você decidiu que não servem para ser seus companheiros de jornada? Vais seguir na intenção de humanizar as coisas e coisificar os humanos, atribuindo um valor menor a quem deveria se mais valorizado?  É razoável essa tua ira? Queres que Eu te trate com a mesma justiça com a qual você se dispõe a julgar os outros? Pense nisso, Marcilio, e depois conversamos!

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Marcilio Egidio

Esposo, pai e pastor – nessa ordem. Eterno aprendiz da arte de servir. Alguém que decidiu colecionar os melhores amigos que a vida pode oferecer.