Grandes Mulheres - Noemi

“A certa altura, porém, Noemi disse às noras: “Voltem para a casa de suas mães! Que o Senhor as recompense pelo amor que demonstraram por seus maridos e por mim. Que o Senhor as abençoe com a segurança de um novo casamento”. Então deu-lhes um beijo de despedida, e as três começaram a chorar em alta voz.”            Rute 1: 8 e 9

Por volta do ano 1220 a.C. os moradores da região de Belém enfrentaram uma grande seca, e consequentemente sofreram com a escassez de alimento. Por causa da fome que assolava seu país, Eimeleque partiu com sua família para as terras de Moabe, a leste do Mar Morto, região abençoada com grande suprimento de água, solo fértil e vegetação semitropical. Os moabitas, como se sabe, eram parentes distantes dos hebreus, já que vieram da linhagem de Ló, sobrinho de Abraão. Eimeleque, cujo nome significava “meu Deus é Rei”, vinha de família piedosa e temente a Deus. O nome de sua esposa Noemi podia ser traduzido por “meu deleite”, expressando a alegria de seus pais ao receberem esta menina nos braços, como um presente de Deus. O casal tinha ainda dois filhos, Malom e Quilom.

A passagem por Moabe não foi assim tão proveitosa para aquela família de servos de Deus. Durante o tempo em que esteve ali, Noemi perdeu o marido e os dois filhos, que havendo casado, deixaram viúvas as duas noras de Noemi – Orfa e Rute. Diante dessas duas mulheres Noemi continuou servindo fielmente o Senhor Deus de Israel, demonstrando ainda muita força, mesmo quando viu morrer também seus dois filhos. Agora aquela mulher estava totalmente desamparada. Sem o esposo, para cuidar do sustento da casa, sem os filhos para oferecerem algum tipo de assistência e numa terra estranha à sua fé e cultura, Noemi sofre, certamente, seu pior momento de privação e sofrimento.

Mas não se deixaria abater pelas circunstâncias. Ao saber do bom momento pelo qual passava sua terra natal, resolveu voltar para Belém, de onde partira muitos anos antes com sua família. Saíra de Belém acompanhada de seu esposo e dois filhos, mas agora voltaria viúva, sem os filhos; sem nada a que se agarrar, para manter a vida em condições mínimas, a não ser sua confiança e esperança em Deus. Decidida como estava, insistiu com suas duas noras que voltassem para a casa de seus pais e seguissem a vida de acordo com a cultura e a religião de seu povo.

Embora estivesse profundamente abatida por suas perdas, sua experiência não havia mudado sua cosmovisão. Sua forma de enxergar o mundo, suas percepções a respeito da vida e do valor do ser humano no plano de Deus ainda se mantinham firmes e inalterados. Suas palavras continuavam a refletir o caráter de Cristo, e seu cuidado com as noras são parte desse modelo de vida. Apesar da própria tristeza que sentia no coração, os pensamentos de Noemi se voltaram para o sofrimento de suas noras. Sua preocupação estava no fato de ser ela já de idade avançada, e não poder mais constituir uma nova família, acabar se tornando um fardo para as noras e um obstáculo para felicidade delas. Orfa decide ficar, mas Rute insiste em acompanha-la.

Ao voltar para sua casa, Noemi demonstra sua grande sabedoria ao instruir Rute no processo de adaptação ao novo ambiente, dando os rumos para um comportamento adequado na cultura hebraica, promovendo, dessa forma, os meios para que Rute seguisse sua vida, a partir de um novo casamento, com um dos homens mais respeitados da cidade. Contrariando o pensamento recorrente de seus compatriotas de que o sofrimento era uma forma que Deus encontrara para punir os pecados do povo, Noemi encontrou forças suficientes, mesmo em meio ao sofrimento, para engrandecer o nome de Deus e testemunhar de sua fé àqueles que estão a sua volta.

Noemi, mais uma dessas Grandes Mulheres, me ajuda a concluir que Deus não precisa, necessariamente, promover o sofrimento como meio para ensinar uma lição ou castigar o ser humano pelos erros cometidos. Por vezes, e quase sempre, o sofrimento é consequência de decisões equivocadas que tomamos ao longo da vida, e justamente por nos tornar mais sensíveis à voz do Eterno, o Criador faz uso do sofrimento para insistir com Suas declarações de amor. Há uma citação muito famosa de C. S. Lewis em que ele diz: “Deus sussurra em nossos ouvidos por meio de nosso prazer, fala-nos mediante nossa consciência, mas clama em alta voz por intermédio de nossa dor; este é seu megafone para despertar o homem surdo”.

O testemunho dessa distinta senhora me ajuda a compreender que preciso olhar para as circunstâncias pelas quais tenho passado, não com olhar passivo de quem deve apenas aceita-lo como manifestação da justiça de Deus, mas como oportunidades para rever meu relacionamento com Ele e tornar meu coração mais sensível ao Seu plano de salvação. Posso olhar para o mesmo evento como quem está sendo compulsoriamente corrigido, ou como quem está sendo convidado a corrigir a rota e avançar em direção à Fonte do amor. Noemi me deixou seu exemplo, mas a decisão será sempre minha – e esse é outro grande presente de Deus.

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Marcilio Egidio - Marcilio - Egidio - Coletivo Cafarnaum

Marcilio Egidio

Esposo, pai e pastor – nessa ordem. Eterno aprendiz da arte de servir. Alguém que decidiu colecionar os melhores amigos que a vida pode oferecer.