Mais uma vez, o que se sabe da personagem de hoje são basicamente as características identificadoras de seu esposo, e nesse caso, como no de ontem, também falecido. O relato começa informando que esses homens não eram jovens solteiros, que viviam reclusos em algum tipo de retiro espiritual. Eram, na verdade, homens do povo, que viviam e trabalhavam normalmente, mas que, ao invés de estarem preocupados apenas com eles mesmos, em busca de uma vida isolada de santidade, atendiam as necessidades do povo, fossem elas materiais ou espirituais, mesmo numa nação que se afastara de Deus. Ele estava entre aqueles que temiam ao Senhor, muito provavelmente por influência do ministério de Elias e Eliseu.
Outra informação importante aqui, é que embora fosse um dedicado servo de Deus, aquele homem havia deixado uma dívida a ser paga, e agora, os credores chegaram para cobrá-la. A falta de recursos para o pagamento em questão levou os credores a exigirem seus direitos garantidos pela lei em vigor naquele tempo. A lei de Moisés reconhecia a servidão por dívida, não como um escravo, mas como uma espécie de ajudante, e exigia, portanto, que o indivíduo servisse apenas até o ano do jubileu, quando todos que estivessem nessa mesma situação eram liberados dos trabalhos e voltavam para seus respectivos lares. Ao que nos parece, os credores abriram mão de cobrar a dívida com o serviço dos filhos desse casal enquanto o homem estava vivo, mas agora que falecera, vieram exigir o serviço dos meninos para saldar a dívida do pai.
A viúva, então, que suportara a perda do esposo e as condições de vida a que fora submetida, agora encontra-se numa situação que lhe causa desespero. Não poderia pensar na possibilidade de ficar sem os seus meninos. Como mãe, não permitiria que algo do tipo acontecesse sem antes eliminar toda e qualquer possibilidade de solução para aquele grande problema. Mas o que poderia ser feito agora, que já não pudesse ter sido feito antes? Onde encontraria os recursos necessários para o pagamento da dívida? Talvez tenha passado algumas noites pensando que apenas um milagre pudesse salvá-los. Isso mesmo, apenas um milagre! “Então”, pensou, “creio que sei quem poderá nos ajudar a encontrar uma saída: Eliseu – o homem de Deus!”
Ao revelar ao profeta sua história, foi surpreendida com a reação de Eliseu: “O que posso fazer para ajudá-la?”, perguntou Eliseu. “Diga-me, o que você tem em casa?” (II Rs 4:2). Como assim, o que eu tenho em casa? – ela poderia ter perguntado. Se tivesse em seu lar algo que pudesse ajudar a resolver a questão, certamente não estaria ali, incomodando o profeta – poderia pensar o leitor, ao se deparar com este relato todas as vezes que tomasse a bíblia para ler. Se a mulher estava ali, era justamente porque não havia nada em sua casa que pudesse saldar a dívida, caso contrário, já teria eliminado o problema a muito tempo.
Não era disso que o profeta falava. Certamente queria ajudá-la a tomar parte no milagre que já estava acontecendo. Queria ajudar-me a entender que Deus usa o que temos para a execução de Seus milagres. Torna meus limitados recursos em soluções extraordinária, através de Seu ilimitado poder. Ele espera por minha disposição de colocar em Suas mãos aquilo que tenho para me levar àquilo que não tenho, e num caso como esse da viúva, àquilo que espero. O milagre, naquele caso, não dependia do que ela tivesse em casa, até porque o Deus que multiplicou o azeite é o mesmo que criou o Universo, e Ele não precisava dos recursos que ela tinha guardado. Mas o Criador, em Sua infinita misericórdia, nos permite participar do processo para aumentar nosso senso de pertencimento e melhorar nossa autoestima.
“Não tenho nada, exceto uma vasilha de azeite”, respondeu ela. Era o suficiente. Sendo apenas uma botija de azeite tudo o que ela tinha em casa, demonstra sua condição de extrema pobreza, mas seria, nesse caso, o meio pelo qual Deus realizaria o milagre de que ela e os filhos tanto precisam. “Então Eliseu disse: “Tome emprestadas muitas vasilhas de seus amigos e vizinhos, quantas conseguir. Depois, entre em casa com seus filhos e feche a porta. Derrame nas vasilhas o azeite que você tem e separe-as quando estiverem cheias” (II Rs 4:3 e 4).
Sempre que leio esta história, imagino a mulher orientando os filhos a pedirem vasilhas emprestadas na vizinhança. Fico pensando na dificuldade que os meninos, principalmente, tiveram para explicar o motivo de estarem recolhendo todos estes utensílios. Mas me encanta, ao mesmo tempo, pensar no envolvimento deles nessa tarefa tão singular. Em cumprimento à ordem do profeta, e de sua mãe, esses meninos saíram dispostos a tornar o milagre tão efetivo quanto possível, e necessário. Penso que se dispuseram a pagar o preço do constrangimento, inclusive, mas como resultado de seus esforços, testemunharam algo que nenhum de seus amigos puderam ver com os próprios olhos – Deus fez multiplicar o pouquinho de azeite que tinham em casa, até encher todas as vasilhas que conseguiram juntar!
Essa história me lembra que preciso tornar minha família participante dos milagres que Deus quer operar em nossa vida. Meus filhos precisam saber de nossas reais condições, principalmente nos momentos de dificuldade, e juntar-se a nós, quando buscamos, em Deus, a solução de nossos problemas. Devem estar dispostos a exercitarem sua fé em Deus, entregando tudo o que têm, e o que são, mesmo que isso lhes cause algum constrangimento, diante de amigos que preferem seguir outros caminhos e não acreditam em milagres. Tal decisão os levarão a viverem experiências incríveis, permitidas apenas àqueles que aceitam o desafio de crer e servir ao Senhor.
A história dessa Grande Mulher me ajuda a reconhecer que tudo isso só será possível se meus filhos puderem enxergar essa mesma disposição em mim. Quanto mais me aproximo desse ideal, mais facilmente poderão perceber sua importância. Quanto maior for a minha demonstração de gratidão a Deus, pelos milagres que Ele tem operado em nosso favor, maior será a compreensão dos meus filhos do benefício de nos reconhecermos totalmente dependentes de Deus. Quanto maior for minha disposição de acompanhá-los no caminho, enquanto procuro ensiná-los por onde devem andar, maior será o interesse deles em permanecerem firmes no propósito de estarmos todos juntos quando a jornada terminar.
Marcilio Egidio
Esposo, pai e pastor – nessa ordem. Eterno aprendiz da arte de servir. Alguém que decidiu colecionar os melhores amigos que a vida pode oferecer.