Sarepta era uma pequena cidade costeira, localizada ente Tiro e Sidom, na Fenícia. Acredita-se que o pai de Jezabel era o governante daquela região. Talvez Elias tenha sido mandado para lá justamente porque seria um dos últimos lugares onde o rei Acabe o procuraria. Ao chegar àquele lugar, o profeta encontra uma das moradoras da cidade apanhando lenha. Uma viúva!
Por não terem direito a herança, as viúvas eram, em sua grande maioria, pobres e dependiam da ajuda dos demais para sobreviverem. Vestiam-se de maneira a serem facilmente identificadas como tal, e recebiam permissão para respigar os campos em tempos de colheita. Por essa época, os grandes produtores contratavam empregados para colherem os grãos da safra e ordenavam aos servos que não voltassem para recolher as espigas, por exemplo, que ficassem caídas pelo chão ou esquecidas nos pés. Ao final do dia, viúvas e estrangeiros eram autorizados a passar pelos campos recolhendo o que ficara para trás.
Devido ao período de seca, o que já era pouco ficou ainda mais escasso, e no caso desta senhora, tudo estava indo de mal a pior. Já não tinha quase nada para alimentar-se e alimentar também o seu filho. Talvez fosse membro de uma das famílias mais pobres da cidade, ou não tivesse nenhum parente que pudesse cuidar dela e do filho. Fato é que estava diante do quadro mais difícil de sua vida: a dor terrível de ver seu filho morrendo diante de seus olhos, ou a possibilidade de deixá-lo sem ninguém para cuidar dele, caso a morte a levasse antes dele. Como todos os moradores da Fenícia, essa senhora não era uma adoradora do Deus de Israel, mesmo assim, sem saber, estava perto de aceitar um grande desafio de fé e deixar sua coragem registrada na história.
Como vimos, ela apanhava lenha, à porta da cidade. Ao aproximar-se, o profeta Elias lhe faz um pedido: “Pode me dar um pouco de água para beber, por favor?” (I Rs 17:10). Apesar de sua situação desesperadora, a mulher ainda foi capaz de sentir algum tipo de empatia e compaixão pelo homem de Deus, como ela mesma passou a chamá-lo depois. “Enquanto ela ia buscar a água, ele disse: “Traga também um pedaço de pão” (I Rs 17: 11). Diante deste pedido, ela finalmente revelou sua real situação. O que tinha em casa, talvez fosse suficiente apenas para fazer uma última refeição, para ela ou para o filho. Tinha apenas um punhado de farinha e um restinho de óleo.
O pedido de Elias parece ser ao mesmo tempo egoísta e insensível. “Não tenha medo!”, disse ele. “Faça o que acabou de dizer, mas primeiro faça um pouco de pão para mim. Depois, use o resto para preparar uma refeição para você e seu filho” (I Rs 17:13). Tal pedido exigiu uma fé tremenda daquela mulher. Abriria mão de atender à necessidade do filho, para responder positivamente ao pedido de um estranho? Por que deveria acreditar em suas palavras? Quem sabe houvesse algo no tom da voz de Elias que lhe passou confiança e tranquilidade para crer que fosse verdade. Quem sabe já tivesse ouvido falar no Deus de Israel, e sabia de Seu poder e dos milagres que já operara através de Seus profetas, e ao ouvir aquele estranho falando em nome do Senhor ela simplesmente creu.
O pedido veio acompanhado de uma promessa: “Pois assim diz o Senhor, Deus de Israel: ‘Sempre haverá farinha na vasilha e azeite no jarro, até o dia em que o Senhor enviar chuva’” (I Rs 17:14); e isto foi o suficiente para que ela, não apenas acreditasse que era verdade, como também aceitasse o desafio de agir com grande fé. “Ela fez conforme Elias disse. Assim, Elias, a mulher e o filho dela tiveram alimento para muitos dias. Sempre havia farinha na vasilha e azeite no jarro, exatamente como o Senhor tinha prometido por meio de Elias” (I Rs 17:15 e 16). Foi o Eterno quem motivou o profeta a fazer exatamente aquele pedido. Ele conhecia a situação daquela mulher e sabia de sua disposição em responder de modo positivo e atender o pedido do homem de Deus. De uma só vez, o Senhor atenderia as necessidades da família, que carecia de recursos para se alimentar, e do profeta, que estava com fome, por causa da sua jornada até chegar àquela cidade.
Eu não sei você, mas já me peguei pensando até que ponto estou, de fato, disposto a exercitar a minha fé em Deus. Fico pensando na história desta viúva, por exemplo, e ao me colocar no lugar dela, tento avaliar se seria capaz de correr os mesmos riscos, sem ter evidência nenhuma de que o profeta estava falando a verdade. E digo isso porque, a exemplo de Tomé, passamos a acreditar mais naquilo que vemos, ou que nos convenceu de ser verdade, a partir das evidências apresentadas. Parece que a fé, por alguma razão, deixou de mostrar a realidade daquilo que esperamos e de nos dar certeza de coisas que não vemos.
Rubem Alves certa vez escreveu: “Fé é um morango que se come pendurado num galho à beira do abismo, pelo gosto bom que se tem, sem nenhuma promessa de que ele nos fará flutuar quando o galho quebrar…” Gosto desta definição, tanto quanto aquela de Hebreu 11:1, parafraseada acima. Ela de fato me encanta. Outro grande desafio, da minha vida, no entanto, é estar disposto a viver a grandiosa experiência de saborear esse “morango”, como presente de Deus, a despeito dos riscos oferecidos pela fragilidade do galho e as dimensões do abismo!

Marcilio Egidio
Esposo, pai e pastor – nessa ordem. Eterno aprendiz da arte de servir. Alguém que decidiu colecionar os melhores amigos que a vida pode oferecer.